A Peste da Escrita
Alguém me diz enfim:
“Você não sabe escrever”.
Nessas fezes de marfim,
não aprendeu a ver,
exceto pela lente de um reles
defensor da falsa igreja
que trocou sem hesitar de pele –
e a entregar sua cabeça de bandeja
por causa das delícias de uma Dalila
a lhe cortar os cabelos dia após dia.
O mestre bebe chá de camomila
com seus seguidores, enquanto a pia
da cozinha se entope de gnose
e suja a marmita de cada um.
O calmante não arrefece a osmose
de heresia que infla o pum
do pobre-diabo nessa hora tão maldita.
Com a culpa marcada na testa,
o aluno ora pela dita
cuja a quem dedicou a vida — e esta
lhe recompensa igual a um pedinte,
incapaz de olhar para a Raimunda
que pensa na comida do dia seguinte
ou em como não dar a bunda
ao rei que lhe oferece
o poder travestido de ilusão.
Todos nós estamos perdidos; o que cresce
com essa peste a devorar a ação
do espírito em torno de uma sabedoria
sempre envolta em mistério?
Nada. Se o zelota for da corregedoria
do meu estilo, peço-lhe no pretérito
da sua abobalhada desgraça:
“Não se preocupe com a minha gramática
e sim com os deveres da graça,
pois seu esmero na tática
da união dos submissos com os pedestres
e ser o cupim que chupa o carvalho
apenas prova que você e o seu mestre
adoram um bom caralho.”