Mestres na arte do fracasso
Baudelaire viu que a tampa da marmita
não seria para todos e deu no que deu:
jogou dados com Deus e Cristo, bebeu
o vinho da liturgia com Satã, lambeu
as coxas da mulata Tourel, resolveu
ir embora de vez deste mundo onde
estava atado com seus grilhões
de chumbo
pois sua modernidade era o
o moderno do
fracasso.
Morreu de sífilis sem deixar de dizer
que a marmita não seria comida
por ninguém
pois
a tampa
jamais seria
aberta.
Daí veio Mallarmé, o bom e velho
Stéphane, que não descobriu
o acaso
porque quis.
Durante cinquenta e quatro anos
ele bebeu o leite dourado
dos seios de
diamante
que as asas da poesia lhe deram
como
um
fardo.
Escavou nas fumaças da sua alma
o mundo de poesia que deveria ser
o ponto de contato entre a imutável
realidade e a sedutora ideia
ao querer a união do Número –
um jogo onde
a aritmética seria
aleatória? –
e do Espírito.
Transformou sonetos em espirais
voltadas em si mesmas, pensadas
sobre si mesmas, vivas em mundo
sem mundo sem morte sem vida
SEM ETERNIDADE
e se não fosse pelo
A C A S O
o fracasso
seria
inevitável.
(A síntese viria como
o fogo
extremo
que não perdoa
o próprio
P O E T A)
O Abismo do Acaso foi a Ascese do Sucesso
para um Mestre destinado ao
N A U F R Á G I O
de uma
E T E R N A
L I N D A
S U B L I M E
Nem mesmo Franz Kafka escapou das
amarras do fracasso.
Morreu tuberculoso com uma
obra fragmentada.
Não casou.
Não teve filhos.
Ficou absolutamente
só
Todo o Fracasso emite a Arte da Sobrevivência
E eu?
Sobrevivo
esperando
vendo
ouvindo
a esperança que não chega
após anos à espreita
na porta do tribunal.
Somos Mestres na Arte do Fracasso
pois não há coragem maior e sucesso
mais sublime do que admitir a própria
Q
U
E
D
A.